minha raivinha me maltratava e eu estava só. não podia fazer nada, não podia reclamar de nada. caçava culpados e ria por não achar nenhum. pensei que prefiro dinheiro. não gosto de gente fina e não me impressiono com prêmios. di-nhei-ro. que todo resto é pélasaquismo e um gostar de todo mundo que é impossível. quem, tendo alma, pode gostar de todo mundo?
minha raiva era discreta e eu tinha duas vantagens: saber sorrir e ser discreto. mostrava meus dentes e alisava minha pança. estava delirante e murmurava pra mim mesmo no mictório: o único afeto que quero é de quem vê minha peça, porque quem vê minha peça pode falar de mim, porque afeto é ver a minha peça porque me conhece. o xixi era um amarelo escuro e encorpado, sentia-me macho com aquele mijo. lembrava dos videos de "chuva dourada" na internet.
então eu voltava e virava mais um copinho. coisa de criança, eu pensei. beber, fuder, cheirar, fumar, falar palavrão... tudo coisa de criança. eu era uma criança estranha, minha mãe me disse. coisa de criança... quem entende? é como ontem: vi a moça e reparei no quanto seus olhos eram apáticos. ela exalava apatia, mas só eu notava. por isso estava só.
meus cigarrinhos se multiplicavam e eles são meus brinquedos. mesmo com tosse, mesmo com catarro. soltei minha última fumaçinha e me despedi educadamente. o ônibus chegou rápido e eu sentei na janela. olhei a orla e fechei os olhos pra sentir o vento que vinha. sorri e balançei a cabeça. coisa de criança.
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