19 de julho de 2009

Era uma borboleta no meio da cara dela, batendo asas e mostrando aqueles dentes brancos e grandes que me agradavam. Os caninos não se destacavam, mas ao olhar com cuidado dava pra ver quer eram mais pontiagudos do que a média.
Eu gostava disso. Mulher carnívora que não se importava com o sofrimento da vaca ao ser abatida. Parecia uma coisa rara nesse mundo de teatro e fêmeas vegetarianas-engajadas.
Ela não. Adorava pernil e cupim. Comia em boteco, pedia miúdos ao molho e sempre colocava mais comida na boca do que sugere o bom gosto.
E comia como um peão, prato cheio e sem medo de perder sua feminilidade fina que se manifestava quando ela mexia as mãos e falava sobre suas preocupações.
E falava muito e com muito detalhes, como uma mulher deve falar.
A gente conversou 3 vezes apenas. Os mesmo papos, as mesma comidas, porções de torresmo e a cerveja abundante quase inofensiva pela ação da gordura. Ela que me explicou: - torresmo com cerveja é quase tão perfeito quanto whiskey e cocaína. É como se o óleo do torresmo estabilizasse o álcool.
No último dia houve um silêncio longo enquanto almoçávamos comida nordestina barata e farta. Estávamos tristes, mas não falamos sobre isso.
Quando nos despedimos, eu disse: - nôs falamos.
Ela me mostrou pela última vez a borboleta branca do meio da sua cara e disse: - não, não nôs falamos.
Virou-se e foi andando. Fiquei olhando pra ela até que entrasse no prédio de sua amiga. Usava uma bermuda até o joelho e uma camisa xadrez com um nó na frente e, mesmo assim, era linda.
Ela sabia das coisas.