15 de março de 2010

quando o possível basta.

Há dias que são exatos. Hoje foi assim. Meu cérebro era meu e eu tinha calma pra pensar nas coisas que tenho que pensar. Quando digo coisas que tenho que pensar quero dizer coisas do mundo prático e real - que é chatinho, mas inevitável.
Resolvi minhas mumunhas e fiquei satisfeito. Conversei com o Tio da Kombi de S. Tereza e vi que meus preconceitos são amparados pelos antigos moradores de lá.
Hoje, se não fosse estupidez, eu diria: sou um cara livre.
E sentado no bar o mundo desfila e eu vejo:
  1. Mulheres com mais de 30 e poucos carregando sacolas de supermercado após o horário de expediente é algo deslumbrante. Há quase um padrão: poucas sacolas, tailleurs e um rosto calmo de cansaço satisfeito. Há qualquer vaidade bonita nessas mulheres: vaidade bíblica do comprará seu pão com o suor do seu rosto. Sempre as imagino morando sozinhas, chegando em casa e tirando as compras da sacola. Daí tomam banho, arrumam a jantinha e se preparam pra dormir. Os lençóis lindos e cheirosos com 13.000 fios.
  2. Elegância é um treco realmente difícil de explicar. Não tem a ver com roupa e não tem a ver com beleza. Elegância é dessas coisas veladas e misteriosas. Quando você se depara com uma elegância, você tem certeza da sua existência. Quando não há elegância você nem lembra que elegância existe.
  3. A Maria é uma bêbada antiga que eu sempre cumprimento com um movimento de cabeça. Já tá velha e bebe na mesa das mulheres bêbadas. Há nessa mesa uma bêbada muito bonitinha. Você só nota que ela é uma bêbada profissional quando repara no cabelo: muito ralo e apagado. O engraçado é que não lembro de ouvir sobre os cabelos quando se fala dos malefícios do álcool. Acho que só os bêbados poderiam falar com propriedade dos malefícios do álcool. Os médicos são limitados nesse sentido: só notam o óbvio.
  4. Há casais surpreendentes que provam que o amor existe. Assim: por que aqueles dois estão juntos? E como não é possível nem uma explicação razoável, você conclui: eles se amam.
  5. Um dos caras que tá envolvido no churrasquinho muda a mesa das carnes de lugar. Ele é chato. Seus companheiros de churrasquinho o acham chato, mas preferem deixar a mesa no lugar que ele diz ser perfeito. O mundo dá suas liçõeszinhas: o chato tem muita força.
  6. É impressionante a força do movimento hippie. Ainda agora, 2010, ele se manifesta. Sou preconceituoso. Só baixei minha guarda quando li o Domingos Oliveira falando do Movimento Hippie, explicando a Contra Cultura e como aquelas idéias eram belas por acreditar que o homem, enquanto espécie, poderia evoluir e melhorar. Mas mesmo assim me incomodo com o garoto fantasiado de hippie que compra crédito pro seu celular na banca de jornal. Ele está fantasiado, eu repito. Não há como ser espontâneo aquilo. Ele tenta reproduzir uma coisa que já passou. É o anti desapego hippie. É o blablabla hype que falam por aí. A ironia é que ele deve ser um garoto cheio de boas intenções e até legal. Mas ele é consciente demais pra ser sincero. Não sei explicar...
  7. As mulatas do Rio são uma coisa. Vejo 2, 3, 4, 5 e todas são uma coisa. Lembro dos Novos Baianos que ouvia na época em que me mudei pra cá: "Pela Morena eu passo o ano olhando o Rio".
  8. A satisfação dos que voltam pra casa depois de uma segunda feira estafante de trabalho quase me dá vontade de ter um emprego como o da maioria. Lembro da Bíblia novamente. Mas mudo de idéia: quero fazer o que já faço com o plus de ganhar um salário decente. Me parece justo mesmo sem achar que o mundo seja justo.
  9. Nas calçadas eu gosto de me impor. É besta. É assim: não dou passagem pra carro quando eu estou na calçada. Calçada é lugar de pedestre e eles que se fodam. As vezes, por pirraça, até ralento o passo. Lembro da única explicação eco-chata anti carros que ouvi e que fez uma puta sentido: 600 kg que transportam 60 kg não parece nada inteligente.