28 de abril de 2009

63 dias.

Fosse como fosse, eu continuava vivendo. Morrer não era uma opção decente. Nunca seria.
A jogada era a mesma: um alguém que espera um outro que deseja uma coisa que nem sabe o que é. A merda velha e fedida. Fedida porque velha e vice-versa.
No horizonte tinha aquela mulher magra. Nunca tinha me imaginado com uma mulher magra. Parecia estúpido. Um casal freak: gordo de 1, 70 e magra de 1, 80. Era errado. E se não fosse errado, era feio.
A tosse piorava, mas isso não queria dizer muita coisa. Era até o contrário. A tosse me deixava mais bonito e mais viril. E o fato de eu insistir com o cigarro fazia de mim um herói.
Não teve nenhuma revira volta e isso me entristeceu. Eu achava que teria qualquer coisa. Tapa ou cuspe na cara tava bom. Pareceria, então, que as coisas voltariam ao seu lugar. Cada um na sua. A solidão honesta. O desespero constante.
A coisa do sangue vazar pelos buracos era constrangedora. Mesmo a merda da morte parecia melhor. Aquelas mulheres delicadas e sorridentes me passavam algodão no cu, nos olhos e nos ouvidos. E elas faziam tudo assim. Como se tivessem nascido pra isso. Como se limpar sangue do rabo fosse uma vocação divina. Um horror.
Os espertos caem fora quando aperta. O idiota me disse e achou que tinha dito a melhor frase de todos os tempos. Como se frases mudassem alguma coisa. Idiota e burro isso sim.
Pro constrangimento da minha magra eu sobrevivi. E ela tinha raiva de mim com alguma razão. É compreensível. Quando se está doente, o doente, se for honesto, tira vantagens da própria doença. Eu tinha sido um bom doente. Morrer era me redimir. Mas não aconteceu.
Minha chance tinha sido perdida, mas eu me sentia bem. Cuspir sangue era quase elegante. Eu era um homem elegante. Eu cuspia de maneira discreta no guardanapo. Aquela coisa de aproximar o pano, ou papel, da boca. Como o caroço de uma azeitona.
A magra ainda do meu lado e dois anjinhos no céu. A insistência é mais surpreendente do que eu imaginava. 2 meses de gestação e um sorriso em cada boca. A vida sempre continua. O óvulo e o esperma ainda têm o seu papel.

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