Minha princesa gigante me telefona de seu castelo. Gostou da pequena cabeça de dragão que lhe enviei. Uma cabeça que caçei e que me deu certo trabalho. O dragão nem era daqui, pertencia à outros asfaltos.
Exigiu alguma luta, mas foi abatido.
Eu, Quixote gordo, estava num dia dos infernos. Noite mal dormida, boca de cinzeiro, pulmão no talo e obrigações idiotas a se cumprir. Tomava um café após a primeira obrigação idiota quando o telefone tocou.
A voz dela estava doce e pastosa. Minha pequena cabeça de dragão havia chego em seu castelo. Ela estava feliz com a oferenda e comentou sobre a casinha que acompanhava o pacote. Achei curioso o destaque dado a casinha e pensei que isso era bom porque, de tudo, a casinha é o item mais resistente.
Meu mau humor infernal se dissipou enquanto eu saia do Shopping. Terminei o café, acendi um cigarro e caminhei lento pra casa.
Na passagem subterrânea reparei no rosto das pessoas que passavam. Muita dor e loucura, muita força e desespero. Pensei que é isso. Viver não é a aventura dos filmes. Eu pensava na satisfação da minha princesa gigante e me sentia bem, apesar de tudo.
No metade da passagem subterrânea, onde é possível ver o céu, cruzei com o Fortão que mora no 2° andar do meu prédio. Nós sempre nos cumprimentamos com um aceno curto de cabeça. Dois machos que se cumprimentam com formalidades ancestrais.
Acho que por estar pensando na minha princesa gigante, o cumprimentei com um aceno de cabeça mais largo e um sorriso satisfeito no rosto.
Pra minha surpresa o rosto do Fortão carrancudo do 2° andar se transformou. Abriu a boca fina num sorriso frágil e sincero. Os dentes, muitos pequenos, se mostraram pela 1° vez.
Até acenamos com a mão.
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